domingo, 4 de março de 2012

A VOZ DOS SINOS

Até há poucos anos, o sino comandava a vida da aldeia. Marcava a manhã, o meio-dia e o começo da noite, no ritmo do trabalho de sol-a-sol. Com o toque das Trindades, convidava a rezar. Ainda repica na alegria das festas, dobra na dor dos óbitos, toca a rebate nos incêndios, chama para a Missa e anuncia os baptizados. O sino é, sem dúvida, uma instituição da aldeia. É património do povo, que o distingue de todos os outros.
O povo, irmanando-se com os sinos, leva-os a falarem uns com os outros, que a tradição oral regista. São interessantes, para o imaginário rural, as onomatopeias ou falas dos sinos, nas suas disputas, em que vence sempre o da própria terra.
Nos anos oitenta do século XX, foi recolhida, no Alcaide, a seguinte onomatopeia fonético-ideológica, relativa aos timbres dos sinos das Donas, de Valverde, da Fatela e do Alcaide.
Diz o sino da Fatela, com voz de mulher rouca, empertigando-se no seu baixo campanário:
“Tem lêndeas! Tem lêndeas! Tem lêndeas!”
Argumenta o de Valverde, com voz de rapariga esganiçada:
“Se tem, tira-lhas! Se tem, tira-lhas! Se tem, tira-lhas!”
Pergunta o sino das Donas, com o seu tom de cana rachada:
“Com quê? Com quê? Com quê?
O sino do Alcaide, senhor do seu nariz, com a voz forte e bem timbrada, no alto da sua linda torre, responde:
“C’um badalão! C’um badalão! C’um badalão!


A torre do Alcaide.

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