sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

ALCAIDE - POSSÍVEIS ORIGENS


            A aldeia do Alcaide é das mais antigas povoações da Serra da Gardunha[i] e do Concelho do Fundão ao qual pertence. Situa-se num contraforte da vertente norte daquela serra, a cerca de seis quilómetros para este da cidade do Fundão, localizada segundo o modelo árabe, com o agregado habitacional num cabeço da encosta e a maior parte das terras de cultivo em zona mais baixa.
            O topónimo Alcaide, de origem árabe, significa o governador, o capitão ou chefe militar (Al-Kaid ou Al-Gaid)[ii]. Também Al-caied, do verbo caidon árabe, em português – governar, administrar, dirigir. Segundo JOSÉ PEDRO MACHADO[iii], há, em Portugal, dezassete lugares designados por Alcaide, devendo-se o seu aparecimento a qualquer chefe militar de povoado próximo, que possuía terras no local e do qual o lugar recebeu a denominação. Existe também a palavra alcalde (do árabe al-qadi), que designa o juiz do concelho, vereador ou alvazil.
            A autoridade alcaidarista (alcaidaria-mor, alcaidaria do mar, etc.) acabou, em Portugal, no século XVIII, restando alguns topónimos e alguns termos no léxico histórico.
            Conforme o Catálogo de todas as Igrejas, Conventos e Mosteiros que havia em Portugal, pelos anos de 1320 e 1321[iv], a aldeia foi também chamada por Aldeia do Pretor, devido, por certo, à sua dependência do alcaide da Covilhã, também designado por Pretor da Covilhã. Prevaleceu, entretanto, a denominação de Aldeia do Alcaide.
            Alguns alcaidenses contam que ouviam dizer aos mais velhos que o Alcaide foi fundado, durante o domínio árabe, por um al-kaid que governou a Covilhã Velha, antigo castro pré-romano, fortificado, da Idade do Ferro, situado na Serra das Casinhas, sobranceiro à povoação de Póvoa Palhaça.
            O Castro da Covilhã Velha, situado a cerca de uma légua a leste do Alcaide, que foi habitado por povos castrejos, também deve ter sido morada de romanos e de árabes. Nas imediações deste Castro, ter-se-á situado a primitiva cidade da Covilhã (Cova Lhana ou Covillana), a denominada Covilhã Velha, onde existe um marco trigonométrico com essa designação.
            Segundo José Mendes Feliz[v], a aldeia serrana do Alcaide foi fundada entre os anos 1198 e 1207, sob o reinado de D. SANCHO I, o rei Povoador, quando este monarca esteve na Covilhã, para tratar da defesa e do povoamento desta vila e do seu termo, doando as terras, que hoje formam o espaço físico da freguesia do Alcaide, ao fidalgo DOM ESTEVÃO ANES (Stephanus Johannis), alcaide da Covilhã, conhecido como o fundador da povoação alcaidense.
            Nas Inquirições de 1290, está registado que o povoamento das terras a que chamavam o alcaide foi efectuado por D. Estêvão Anes e que essas terras a ele pertenceram.
            As Inquirições de D. DINIZ[vi], de cerca de 1314, referem o povoamento do Alcaide do seguinte modo:
           A aldeya que chamam do Alcaide, dizem as ts q ffoy do alcaide Dom Estevam e que a ouve do pobramento da terra e que lha virom trager por hõrra sem linhage e trager hy seu moordomo e sseus alcaides.[vii]
           Sobre este facto, refere José Hermano Saraiva[viii]:
          Quer isto dizer: em 1314, ainda viviam pessoas muito velhas, que sabiam que tinha havido um povoamento de regiões. O Alcaide Dom Estevam, que ainda tinham conhecido, e cujos descendentes viviam, instalou-se no lugar que é hoje a aldeia do Alcaide, e a terra ficou com honra, isto é, ficou imune de qualquer pagamento ao rei, porque D. Estevam era fidalgo.

            No entanto, Joaquim Candeias da Silva[ix] refere que a povoação de Alcaide deve ter sido fundada por meados do século XIII, porque, entre os anos de 1198 e 1207, era alcaide da Covilhã D. PEDRO DE GUTIERRES e não D. ESTEVÃO ANES, e, por, em 1314, ainda existirem testemunhas que se lembravam bem de D. ESTEVÃO e de o terem visto trazer a terra.

Serra da Gardunha. O ramo central, em primeiro plano,  é conhecido por serra do Alcaide.
Em primeiro plano, arrabaldes do Alcaide; ao centro e à esquerda, modernas habitações; em último plano, a serra da Gardunha (serra do Alcaide).

O lugar do Carvalhal na serra do Alcaide.

Ruínas do Castro, na Covilhã Velha.

Ruínas do Castro, na Covilhã Velha.

A aldeia de Alcaide molda-se num contraforte da serra da Gardunha. Foto de José da Cruz, dos anos 50 do século passado.  

O Alcaide actual, no contraforte da serra da Gardunha.
Habitações tradicionais no Fundo do Povo.

Terras baixas do Alcaide, inseridas na Cova da Beira.


NOTAS
[i]  A serra da Gardunha, com 1223 metros de altitude, orientada na direcção E-W, é um prolongamento, para Sul, da Cordilheira Central da Península Ibérica, da qual fazem parte as serras espanholas de Gredos, de Guadarrama e da Gata . A parte da Serra da Gardunha, compreendida nos limites da freguesia do Alcaide, é conhecida por Serra do Alcaide.
[ii]  ALBUQUERQUE, Ruy de - Verbo Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Editora VERBO, Lisboa, 1963, 931.
[iii]  MACHADO, José Pedro - Dicionário da Língua Portuguesa, Vol. VI, Editora Sociedade de Língua Portuguesa, Lisboa, 1965, 4.
[iv] Biblioteca Nacional de Lisboa - Códice 179.
[v]  FELIZ, José Mendes - O Alcaide - Elementos para a sua História, Edição da Liga dos Amigos do Alcaide, Alcaide, Fundão, 1968, 16.  
[vi] Arquivo Nacional da Torre do Tombo - L 9, fl. 34, parag. 5.
[vii]  MONTEIRO, José Alves - Ao Redor do Fundão, Editora Jornal do Fundão, Fundão, 1990, V.
[viii] SARAIVA, José Hermano - O Concelho do Fundão, Jornal do Fundão, Ano de 1990, V.
[ix]  SILVA, Joaquim Candeias da - O Concelho do Fundão através das Memórias Paroquiais de 1758, Editora Jornal do Fundão, Fundão, 1993, 22, 24.

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